Cerca de cinquenta moradores da Vila Palmira, próxima de Picinguaba, reuniram-se no Plenário da Câmara nesta quinta-feira (04/12) em audiência pública para discutir proposta de iniciativa popular de projeto de lei visando tornar a área Zona de Especial Interesse Social (ZEIS) e reconhecendo-a como Comunidade Tradicional como previsto no Plano Diretor do Município e no Estatuto da Cidade. Localizada no início de Picinguaba, Vila Palmira busca descolar-se daquele bairro da Zona Norte de Ubatuba buscando com isso conquistar algumas concessões da administração do Parque Estadual da Serra do Mar que impõe uma série de restrições aos moradores que ali estão há décadas.
“O Parque tirou nossa cultura, o Parque roubou nossas tradições”, reclamou o morador Gelson da Conceição. “Imaginem, em pleno século XXI, quase 2020, uma comunidade ser proibida de contar com energia elétrica. Por quê temos que parar no tempo? Porque temos que pedir licença para a Polícia Florestal para reformar uma casa? Não fomos nós que invadimos aquela área. O invasor é o Parque Estadual”.
Gelson explicou ainda que “a gente não vai subir morro acima. Vamos ficar ali onde estamos, uma área ainda com mais árvore do que no topo do morro pois é nossa tradição preservar”.
“Não somos bandidos” – Vários moradores, incluindo representantes do Fórum de Comunidades Tradicionais, revezaram-se nos pronunciamentos pela Tribuna Popular, sempre com críticas à administração do Parque Estadual. Criado em 1977, a área de preservação abrange todo o Município de Ubatuba, com exigências específicas de ocupação.
No entanto, os moradores alegam, com razão, que eles já estavam lá muito antes da criação do parque. Guilherme Mariano Costa, por exemplo, disse que “nasceu lá em 1971, sou nativo, estou lá há 49 anos, meu avô fazia roça ali e morreu com 94 anos, minha avó morreu com 105 anos, sempre morando ali. Não podemos melhorar a casa, não deixam.”
“E constantemente vemos a Polícia Florestal passar de helicóptero, filmando”, continuou. “Não somos bandidos pra ficar assinando carteirinha. Somos da terra.”
Dona Jaqueline dos Santos, também moradora, reclamou que “as crianças , nosso futuro, não tem opções de lazer, mas está lá abandonada no mato uma quadra poliesportiva que não pode ser recuperada, não deixam. Está abandonada, tomada por cobras e mato crescendo. Buscamos também uma área para implantar uma horta comunitária. Não pode e tem espaço, muito espaço”.
Ivan Carlos da Silva, presidente da Associação de Moradores de Picinguaba lembrou que “o parque chegou lá em 1977, foi oficializado em 1979, mas temos documentos de 1950 em nome de moradores de lá. Queremos apenas que nos deixem viver em paz”.
A audiência foi apresentada como “início de um trabalho, uma provocação. Há cálculos de que 65 mil pessoas visitam o parque por ano e se cada turista deixar um mínimo de R$ 100,00, isso geraria uma arrecadação aproximada de R$ 6.5 milhões.
Há propostas para mudar o modelo de administração do parque para que ele seja tripartite com participação da Prefeitura, da comunidade e do Estado. Não houve participação de representantes do Ministério Público e nem da Polícia Florestal.
Os debates foram mediados por Vitor Duarte, da assessoria do gabinete do Vereador Junior JR (Podemos), também presente, que se propõe a encaminhar o projeto de lei sobre ZEIS e Comunidade Tradicional para votação na Câmara. O advogado, especializado em regularização fundiária, Claudinei Salgado também compôs a mesa.